Crônica - 9ºANO
O segredo da propaganda é
a propaganda do segredo
Depois de tantos anos vendo televisão
diariamente, chego a uma conclusão definitiva: é muito mais divertido e mais
prático ver os anúncios. Enquanto as outras pessoas ficam aflitas tentando
decorar os horários das novelas, das paradas de sucesso e dos chamados
programas humorísticos, eu não tenho problema: ligo a televisão em qualquer
canal e vejo os anúncios sem preocupação de horário.
Vocês talvez achem que é loucura ver
os mesmos anúncios diversas vezes, mas posso garantir que os anúncios variam
muito mais que as piadas e as músicas que são servidas todos os dias. Pelo
menos os anúncios são bem bolados, alguns até inteligentes. A técnica é chatear
tanto até ficarem em nosso subconsciente — se é que alguém consegue ter
subconsciente assistindo televisão.
Os refrigerantes, por exemplo: quase
todos fazem as garrafas dançar na nossa frente e tocam uma musiquinha que chega
a dar sede. Aí a gente não resiste: vai à geladeira e bebe um copo de água. Mas
bom mesmo é anúncio de sabonete: aparece cada moça bonita que vou te contar. E
com uma grande vantagem, as moças não falam, só aparecem, ligam o chuveiro e
ficam noivas dentro da espuma. Por mais que a gente saiba que aquilo é anúncio
de sabonete, fica sempre aquela dúvida se um dia eles não vão resolver dar o
nome daquele chuveiro ou, quem sabe, o telefone da moça.
Geniais mesmo são as geladeiras que
duram toda a vida. Mas muito mais geniais são os textos garantindo que cabe
tudinho dentro delas, mas acho que não têm tanta certeza, pois fazem questão de
botar uma moça bem bonita pra mostrar a geladeira — e a gente tem é vontade de
comprar a moça, mesmo sem o “certificado de garantia”. E as televisões,
baratíssimas, cada vez mais vendidas, dentro dos novos planos de venda. Ao
invés de bolarem uma televisão mais perfeita, ficam é bolando planos de venda.
No dia em que inventarem uma televisão que focalize a cara de um sujeito com
menos de três orelhas, não precisam nem fazer anúncio: é só exibir, que esgota
no mesmo dia.
Existe anúncio de todo tipo: tecidos
que não amarrotam, tecidos que dão prêmios, tecidos que dão desconto, tecidos
coloridos que são apresentados em preto e branco, tecidos brancos que ficam
cada vez mais brancos à medida que vai surgindo um novo sabão em pó. Mas é o
que eles pensam: o branco deles, lá em casa, todo mundo tá vendo que é cinza. O
mais engraçado são os anúncios de inseticidas que matam todos os insetos, menos
as moscas do estúdio. Anuncia-se também muita banha, muito pneu, muito perfume,
muito sapato, muito automóvel, muita calça, muita bebida e muita pílula pra dor
de cabeça. Parece até que um anúncio depende do outro — é como se fosse uma
novela, com a vantagem de a gente sempre saber qual o final de cada anúncio. E
não pensem que sou o único a achar os anúncios mais interessantes que os
programas: os donos das emissoras também acham — senão não ocupavam a maior
parte do tempo com anúncios. Nos intervalos é que colocam alguns programinhas —
por absoluta falta de mais anúncios.
Reparem só: os programas de humor
mostram o lado negativo das pessoas, os personagens são quase todos
fossilizados, gagos, surdos, cegos, velhos borocoxôs
ou sem sexo definido. As novelas exploram seres anormais dentro de um mundo de misérias
e lágrimas. Já os anúncios apresentam um mundo de otimismo, onde tudo é bom e
saudável, não quebra, dura toda a vida e qualquer um pode adquirir quase de
graça, pagando como puder, no endereço mais próximo da sua casa. O único detalhe
que nos deixa um pouco frustrados é que a moça que dá os endereços fala tão preocupada
em não errar que a gente não consegue decorar nenhum endereço. Em compensação,
sabe de cor a moça todinha.
Borocoxôs: sem ânimo ou energia.
Leon
Eliachar. Disponível em:
<http://www.releituras.com/leoneliachar_osegredo.asp>. Acesso em: 10 dez. 2014
1. O
narrador dessa crônica é personagem ou observador? Por quê?
2. Releia
este trecho.
“A técnica é
chatear tanto até ficarem em nosso subconsciente — se é que alguém consegue ter
subconsciente assistindo televisão. ”
•Qual a
crítica que o autor faz à televisão nesse trecho?
3. Releia o
trecho abaixo.
“Os
refrigerantes, por exemplo: quase todos fazem as garrafas dançar na nossa frente
e tocam uma musiquinha que chega a dar sede. Aí a gente não resiste: vai à geladeira
e bebe um copo de água. ”
• Qual o
efeito de humor presente no parágrafo?
4. A ironia
é um elemento importante na construção dessa crônica.
a) Qual
ironia é a base desse texto?
b) Copie o
trecho em que uma ironia é empregada.
• “Geniais
mesmo são as geladeiras que duram toda a vida. ”
• “Mas é o
que eles pensam: o branco deles, lá em casa, todo mundo tá vendo que é cinza. ”
• “As
novelas exploram seres anormais dentro de um mundo de misérias e lágrimas. ”
Essa cronica kkk, mto boa
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